A questão em discussão consiste em saber se o direito ao esquecimento pode ser aplicado para afastar a consideração de maus antecedentes, considerando o tempo decorrido entre a extinção da pena de crime anterior e a prática do novo delito.
O legislador não estipulou um prazo para a delimitação dos efeitos dos antecedentes, como fez com a agravante da reincidência, para a qual previu o prazo de 5 (cinco) anos, contados entre a data do cumprimento ou extinção da pena e a infração posterior (art. 64, I, do CP).
Sucede que a leitura do art. 59 do CP deve ser feita tomando como base a Constituição da República, que, em seu art. 5º, XLVII, b, veda, expressamente, sanções de caráter perpétuo, bem como a finalidade da ressocialização da pena. Esta previsão demonstra, claramente, a preocupação do legislador em limitar, temporalmente, os efeitos da condenação.
Quanto ao tema, o Supremo Tribunal Federal, no RE n. 593.818/SC, sob o regime da repercussão geral (Tema 150), pacificou a compreensão de que: “Não se aplica ao reconhecimento dos maus antecedentes o prazo quinquenal de prescrição da reincidência, previsto no art. 64, I, do Código Penal, podendo o julgador, fundamentada e eventualmente, não promover qualquer incremento da pena-base em razão de condenações pretéritas, quando as considerar desimportantes, ou demasiadamente distanciadas no tempo, e, portanto, não necessárias à prevenção e repressão do crime, nos termos do comando do artigo 59, do Código Penal.”
Destarte, alinhando-se com este entendimento, a teoria do direito ao esquecimento passou a ser reconhecida em alguns julgados da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, para afastar a configuração dos maus antecedentes quando as condenações utilizadas são muito antigas.
Outrossim, ciente de que a neutralização da vida pregressa deve ser feita em etapas, no silêncio do legislador, convencionou-se a adoção do prazo de 10 (dez) anos, contados entre a data do cumprimento ou extinção da pena e a infração posterior, para a aplicação da denominada teoria do direito ao esquecimento, em tenção ao direito à ressocialização e ao princípio da dignidade da pessoa humana.
No ponto, cabe ponderar que esta delimitação temporal não é estanque e objetiva, permitindo uma apreciação discricionária do magistrado, em consonância com os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade.
Além do mais, a menção a este prazo não viola o princípio da legalidade, pois não há uma atuação do Poder Judiciário como legislador positivo, mas como instância garantidora dos direitos fundamentais, na medida em que o objetivo é proteger o indivíduo contra uma omissão do Poder Legislativo que pode lhe acarretar a eternização da pena.
Dessa forma, o direito ao esquecimento pode ser aplicado e o cômputo do prazo (10 anos) para a sua aplicação, em relação aos antecedentes, é realizado entre extinção da pena anteriormente imposta e a prática do novo delito.
Processo: Processo em segredo de justiça, Rel. Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, por unanimidade, julgado em 26/3/2025, DJEN 2/4/2025.
Fonte: STJ, Informativo 856, 5-8-2025.