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Criminalidade de empresa não se confunde com organização criminosa

O que não era usual, passou a ser após o julgamento do HC 81.611 pelo Supremo Tribunal Federal: empresários serem acusados da prática do crime de formação de quadrilha ou organização criminosa, além da imputação de crimes econômicos, à exemplo da sonegação fiscal.

Na ocasião, decidiu a Suprema Corte que as ações penais relativas a crimes tributários deveriam ser obstadas enquanto estivesse pendente decisão final na esfera administrativa a respeito da exigibilidade ou não dos tributos.

Em decorrência desse entendimento iniciado em 2003, como forma de contornar o encerramento de ações penais nos crimes tributários, as acusações passaram a contar com um “plus”, recaindo sobre os ombros dos empresários a imputação do crime de formação de quadrilha.

E mais, de forma confusa, emprestando à criminalidade de empresa o conceito de organização criminosa sobrevieram consequências desastrosas: prisão temporária, interceptação telefônica, infiltração policial, quebra de sigilo bancário, fiscal e telemático, etc colocados à disposição do Estado para o combate a esses novos inimigos da ordem pública. Com essa receita e o indissociável acompanhamento e cobertura da mídia é que se apresenta o sucesso da luta contra o crime.

Até recentemente (julho de 2012) não existia em nosso país o conceito de organização criminosa, não se olvidando que a omissão legislativa não podia sersuperada com a denominação de “grupo criminoso organizado” trazida pela Convenção da ONU contra o crime organizado transnacional (Convenção de Palermo – 2000), ratificada pelo Brasil em 2003.

Com a edição da Lei 12.694 (publicado no DOU de 25/07/2012), a questão foi superada com a definição de organização criminosa como sendo ” a associação, de 3 (três) ou mais pessoas, estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas, ainda que informalmente, com objetivo de obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer natureza, mediante a prática de crimes cuja pena máxima seja igual ou superior a 4 (quatro) anos ou que sejam de caráter transnacional”.  (artigo 2º da lei).

Por aí não se está autorizado a concluir que crimes ocorridos no seio da empresa possam ser fruto de uma “organização criminosa”.

 Não é bem assim. Como na música, o direito não pode sofrer distorções sob pena de perder a harmonia.

Em regra, as empresas não são criadas para a prática de crimes. A Constituição Federal, que rege o sistema, reconhece e estimula a associação de pessoas para o exercício de atividades econômicas. E, se verificado o crime no âmbito das empresas, não se estará a defender que os responsáveis por ele devam ser apenados com a impunidade. Não é isso.

Enfim, em obediência ao Estado Democrático de Direito, criminalidade de empresa não pode ser generalizada e confundida com organização criminosa. Em companhia de Paulinho da Viola “tá legal, eu aceito um argumento, mas não me altere o samba tanto assim”. Eis a melhor receita.

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