Por unanimidade, a 2ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo determinou que a Procuradoria-Geral de Justiça reexamine um inquérito policial que foi arquivado em primeiro grau.
De acordo com os autos, um homem registrou um boletim de ocorrência contra a ex-namorada por suposta lesão corporal e ameaça. O exame de corpo de delito constatou lesões de natureza leve e, aos policiais, a investigada confirmou ter ameaçado e agredido o ex-namorado durante uma discussão. Foi reconhecida a prescrição do crime de ameaça.
Em seguida, o Ministério Público pediu o arquivamento do inquérito policial com relação ao crime de lesão corporal, por entender que os fatos foram isolados e a vítima não relatou as agressões no dia do ocorrido, e também porque as testemunhas confirmaram apenas ameaças e discussões, “contexto em que inexistiria suporte probatório para o início da ação penal”.
O juízo de origem acolheu o pedido do MP e determinou o arquivamento. O homem, então, pediu a remessa dos autos à Procuradoria-Geral de Justiça, com base no § 1º, do artigo 28, do CPP, com a redação dada pela Lei 13.964/2019 (“pacote anticrime”). Segundo o dispositivo, se a vítima não concordar com o arquivamento do inquérito, poderá submeter a matéria à revisão da instância competente do órgão ministerial.
O pedido foi indeferido em primeira instância porque o dispositivo em questão está suspenso por liminar concedida na ADI 6.305, em tramitação no Supremo Tribunal Federal. Em janeiro de 2020, o ministro Luiz Fux suspendeu a eficácia do caput do artigo 28 até o julgamento do mérito da ADI. Por isso, o TJ-SP acolheu o pedido do autor, mas por fundamento diverso.
Segundo o relator, desembargador Francisco Orlando, na decisão de Fux, há menção apenas ao caput do artigo 28, mas é “patente” que se pretendeu suspender a vigência de todo o dispositivo, “até porque consignou expressamente que suspendia a nova sistemática de arquivamento de inquérito policial (e o § 1º faz parte dessa sistemática) e que até que julgada a ADI, continua em vigência a antiga redação”.
Apesar de afastar a aplicação da nova redação do § 1º, do artigo 28, do CPP, o relator discordou da decisão do magistrado de primeira instância de arquivar o inquérito. Para Orlando, há indícios suficientes da autoria e da materialidade do crime de lesão corporal, justificando o prosseguimento do caso.
“Enfim, é mesmo caso de determinar a remessa dos autos à Procuradoria-Geral de Justiça, nos termos do artigo 28, do CPP (redação original), já que presentes elementos suficientes para propositura de ação penal, a denotar a presença de direito líquido e certo à revisão da manifestação ministerial de primeira instância”, afirmou.
Em declaração de voto, o terceiro juiz, desembargador Luiz Fernando Vaggione concordou que o § 1º, do artigo 28, do CPP, foi alcançado pelos efeitos da liminar concedida na ADI 6.305. Mas adotou fundamento diverso do relator para justificar o reexame do caso pela Procuradoria-Geral de Justiça. Vaggione falou em “flagrante ilegalidade” no pedido do MP para arquivar a investigação.
“Não obstante a inequívoca prova da materialidade do crime de lesão corporal e diante da prova da autoria, confessada pela própria parte investigada, como também constou no voto do e. relator, o parquet formulou o pedido de arquivamento do inquérito, homologado pelo juízo de origem. Por esse motivo, o reexame pela chefia do Ministério Público viabiliza nova apreciação dos fundamentos que determinaram o arquivamento do inquérito, dada a singularidade do cenário exposto na inicial desta ação”, disse.
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Processo 2173479-34.2022.8.26.0000
Fonte: Revista Consultor Jurídico, 20-10-2022